ACESSIBILIDADE, segundo o dicionário, é um substantivo feminino. É a qualidade ou caráter do que é acessível, a facilidade na aproximação, no tratamento ou na aquisição.
Num primeiro instante, quando pensamos na palavra “acessibilidade”, nos vem à cabeça cadeirantes, deficientes visuais, idosos, entre outros. Porém, apenas por um momento, vamos voltar nosso pensamento para outra acessibilidade: das rodovias e seu entorno.
Em se tratando de infraestrutura rodoviária, quando pensamos em uma via, de forma geral, acessibilidade nos remede à facilidade na aproximação. Ao mesmo tempo, uma rodovia remete a ligações de longa distância, ou seja, viagens entre cidades, estados e até mesmo países.
Então fica um pouco contraditório, não é? Falar em acessibilidade, na facilidade de chegar ao seu destino e, ao mesmo tempo, afirmar que as rodovias têm como finalidade a ligação entre pontos distantes, ficando as viagens curtas ou locais a cargo de estradas vicinais, avenidas e ruas das cidades e bairros. Como assim?
Nas rodovias federais brasileiras, em muitos casos, são observadas as chamadas travessias urbanas. Estas, costumam ser provenientes de pequenas localidades que já existiam previamente à implantação da rodovia, ou então em locais onde os aglomerados urbanos se formaram próximos à via, posteriormente à implantação da mesma. Em ambos os casos, a rodovia serve como um vetor de crescimento, pois a movimentação de pessoas e cargas através dela, leva à necessidade de serviços como postos de combustíveis, restaurantes, hotéis, entre outros, fazendo com que um comércio surja e, consequentemente, vilas, bairros e até mesmo cidades inteiras.
No Brasil, existem diversas cidades onde a rodovia, independentemente de ter chegado antes ou depois das aglomerações urbanas ao seu redor, passa a servir como a avenida principal da cidade. Por vezes, atua ligando bairros que se desenvolveram em lados opostos ou servindo para deslocamentos ao longo da cidade, tarefa esta que, a princípio, deveria ser de responsabilidade das avenidas e ruas do município, com o menor contato possível com a rodovia. Dessa forma, a rodovia seria responsável apenas pela passagem de veículos de longa distância, os quais não possuem aquela cidade como destino final.
E o que temos visto nas travessias urbanas ao longo das rodovias pelo país? Um misto de situações. E isso nos remete ao fato de que, mesmo servindo para ligações de longa distância, na existência de travessias urbanas, as rodovias devem ser “acessíveis”. É aí que o conceito de acessibilidade na infraestrutura rodoviária fica mais claro e exemplo é o que não falta!
O município de Lages/SC, localizado na região do Planalto Serrano, teve grande desenvolvimento nos últimos anos nas proximidades da BR-282/SC. Esse crescimento fez, exatamente como citado anteriormente, que a rodovia se tornasse praticamente uma avenida da cidade, como pode ser observado na imagem a seguir, que mostra o cruzamento da rodovia com a Avenida Luís de Camões, no ano de 2010, onde se encontravam implantados semáforos, faixas de pedestres e redutores de velocidade, os quais provocavam congestionamento na rodovia, principalmente de veículos de transporte de cargas.
Fonte: Google Earth Pro, 2019.
Neste ponto, pode-se dizer que a acessibilidade ao município era grande, pois haviam diversos cruzamentos com avenidas e ruas ao longo de toda a travessia urbana, ou seja, havia facilidade no acesso. Porém, segundo Sousa, L. R., et. al. (2019), essa situação era desfavorável, principalmente devido aos conflitos entre tráfego local e tráfego da rodovia, o que causava grande número de acidentes na região.
Umas das opções existentes para melhorar a situação seria a implantação de um contorno ao município. Porém, o mesmo seria bastante extenso e, consequentemente, os investimentos necessários para sua implantação seriam elevados, devido à ampla área do município de Lages/SC. Outra opção seria a adequação da rodovia, no próprio local onde estava localizada.
Assim, entre 2011 e 2014, a rodovia recebeu obras de melhoria no trecho da travessia urbana de Lages/SC, visando aumentar sua capacidade e melhorar seu entorno, principalmente quanto aos acessos diretos existentes, cruzamentos em nível e travessias de pedestres. A rodovia foi parcialmente duplicada, houve a implantação de interseções em desnível para acesso ao município e cruzamento das avenidas existentes, implantação de vias marginais, eliminando os acessos diretos, entre outros.
A imagem a seguir mostra o mesmo cruzamento apresentado anteriormente da BR-282/SC com a Avenida Luís de Camões, em 2019, após a implantação das obras de melhoria na travessia.
Fonte: Google Earth Pro, 2019 (modificado).
Então, pode-se pensar que a acessibilidade ao município, comércios e residências próximas à rodovia foi diminuída, pois agora há necessidade de utilizar as vias marginais e, por vezes, fazer retornos mais distantes dos que eram realizados antes. Porém, foi aumentada a segurança da rodovia e de todo seu entorno, a partir da utilização de dispositivos adequados de engenharia.
Citando-se apenas um exemplo do estudo de Sousa et. al. (2019), os principais tipos de acidentes verificados no trecho analisado foram as colisões lateral, transversal e traseira em todos os períodos em análise (antes, durante e após as obras no local). Estes tipos de acidentes, considerados juntos, apresentavam em média 9,06 ocorrências por mês antes da implantação das obras. Após a conclusão destas, a média mensal destes tipos de acidentes baixou para 3,28, mostrando a efetividade das melhorias implantadas. Destaca-se que estes valores aqui apresentados não consideram o aumento do tráfego ocorrido na região e mostrado pelos autores citados.
Assim, pode-se concluir que a acessibilidade é extremamente importante e tem a ver sim com as rodovias, mesmo estas sendo responsáveis pelos chamados deslocamentos de longa distância. Porém, deve-se atentar à segurança desta acessibilidade, pois acessibilidade sem segurança aumenta os riscos de ocorrência de acidentes e de todos os problemas consequentes disso.
É necessário que os projetos de engenharia busquem as melhores soluções técnicas, analisando os custos e benefícios de cada tipo de intervenção possível (como no caso citado anteriormente: adequação versus contorno), promovendo-se comparativos, visando o bem dos usuários da via, da população lindeira e bons investimentos ao órgão responsável.
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Palavras-chave:
Rodovia. Travessia urbana. Via. Acessibilidade. Adequação de rodovia. Engenharia de tráfego. Infraestrutura.
Referências:
SOUSA, L. R., ZANELLA, R. A. R., VARGAS, V. C. C. Adequações na BR-282/SC, travessia urbana de Lages/SC: Um estudo de caso dos acidentes de trânsito antes, durante e após as obras. Artigo. 2019.